Novo Endereço do Apogeu:
http://www.apogeudalienacao.blogspot.com/
“Dois mais dois. Coloque dois dedos em uma mão e dois em outra.”
A menina esticou os dedos como se fosse um frango ciscando.
“Dois!” Eu disse.
Ela ajeitou e, não sei se foi por acaso, fez um dois com a mão.
“Agora dois na outra. Dois! Isso! Agora conta.”
Ela contou:
“1, 2, 9, 7, 5…”
“Vamos contar, criatura: 1, 2, 3, 4. Deu quatro. Agora escreve.”
Ela fez algo parecido com um tridente, meio assim: Pelo menos ela tem alguma noção do que seja um quatro.
“Agora quatro mais três. Coloca quatro em uma mão…”
Eu tive que ajeitar para fazer o quatro.
“E três em outra. Agora conta.”
De novo a desgracência:
“9, 7, 3, 2…”
Contei junto com ela:
“1, 2, 3… Deu sete, não deu? Agora faz aí.”
Ela fez algo parecido com um 9. Mandei apagar e fazer de novo. Ela fez algo parecido com um 1.
“Sua jomenta tu não sabe o que é um sete, criatura?!”
Mas lógico que eu não disse isso, embora me passasse pela cabeça. Respirei fundo e prossegui:
“Tá certo. Faz a outra: cinco mais um. Bota cinco em uma mão…”
Ela rodou a mão de tudo quanto foi jeito. Fez um dois, fez um três, fez um chifrinho, fez um sinal de hang loose. Mas não foi capaz de estender a palma da mão uma única vez para que eu, hipocritamente, dissesse “certo”. Ela parou. Eu olhei para ela desestimulada e disse: “agora faz o um na outra”. Ela fez qualquer coisa. “Certo. Agora conta.”
“3, 9, 4, 2, 6.” – continuou aquele filhote de cruz credo.
Parou no seis.
“Agora escreve.”
Foi isso que ela escreveu. “Que diabeisso, meu Deus?” – eu pensei.
“E agora professora?”
“Faça a outra” – falei entre os dentes. “Três mais dois. Desenha bolinhas. Desenha três bolinhas…”
Ela fez várias bolinhas. Parou e me olhou. Como eu não disse nada, ela continuou. Encheu o caderno de bolinhas.
ESSE FOI UM CASO REAL DE UMA CRIANÇA DE SEIS ANOS, MAS PODE SER ENTENDIDO COMO UMA METÁFORA DE UM ANALFABETO FUNCIONAL EM DESENVOLVIMENTO. NÃO É UM CASO ISOLADO E NEM UMA RARIDADE.